sexta-feira, 13 de julho de 2007

Espelho, espelho meu

Quarta eu quis escrever, fiquei com preguiça. Quinta eu quis escrever também, mas a conexão não me permitiu. Não sei mais quando vou postar esse texto...

Quis escrever sobre beleza, mas sobre a minha beleza negra específica; gritar ao mundo o que é ser mulher negra em um país de maioria negra, em que seus habitantes têm vergonha de dizer a cor da sua pele.

O meu mundo é branco. Desde pequena, acordo e vou para alguma instituição de ensino onde a maioria vai ser branca: meus amigos, meus professores... A única identificação negra que possuo nesses lugares são seus funcionários.

Sou estudante de jornalismo, mas não leio jornal, não gosto, não conta nada de novo, por incrível que pareça. Só quem faz jornalismo sabe a besteira que são os jornais. Claro, não todos, muitos jornais, revistas, sites e afins se salvam no mar de asneiras publicadas diariamente; daí, só leio a galera que vai contra a maré.

Mas não importa os veículos, todos eles são brancos. Nas propagandas, nas matérias políticas, econômicas, sociais, culturais. Eu não me enxergo no meu país.

Reclamo bastante, mas muito mudou: o mundo negro se insere a cada dia mais nesse mundo (ironicamente) branco. Hoje existem revistas e outros mais, voltados aos negros, o que é muito importante.

Será que a população brasileira sabe a importância desses produtos?

Vou ilustrar com um exemplo como é necessário ter um espelho na mídia para sua auto-afirmação:

A Xuxa é que nem o Faustão, nunca vai desistir da TV
, assim, quando eu era pequena ela já habitava a telinha da Globo, com seus fartos cafés-da-manhã, com o Dengue, e o outro boneco lá e com suas paquitas. Tinha a Angélica, sua pinta e o SBT. Um pouco depois apareceu a Eliana, a música dos dedinhos e Melocoton. O que as três têm incomum? São loiras, claro! (Não cabe citar a Mara, afinal, ela era morena, mas é bom lembrar da Jaqueline que veio anos mais tarde).

Parece pequeno e discreto, mas a opressão midiática me afetou em cheio quando eu pensei que não poderia ser uma das paquitas. Parece um desabafo patético, mas para uma criança de sete, oito anos é muito. Um dia surgiu uma ajudante da Xuxa, que era morena, mas que em algum momento fez luzes também. A cor do cabelo não importava, era a cor da pele que estava em questão. Eu jamais poderia pintar meu cabelo de loiro, a não ser que não tivesse o mínimo bom senso. Eu não podia estar na televisão como apresentadora, mocinha de novela ou âncora de telejornal; a minha pele representava a empregada doméstica, a prostituta (já citamos o seu valor aqui), o malandro, o bandido, e assim vai... “Ser negro era ser ruim”, parecia dizer os meios de comunicação, de uma forma inconsciente, e eu não queria ser ruim.

Lembro que na segunda série escrevi em uma redação que achava um defeito ser negra; hoje me envergonho de ter dito tamanha asneira. A sábia professora escreveu na redação “você é linda”, aí eu repensei e acreditei nela.

Graças aos meus estudos, esclarecimentos e etc., hoje sei como sou bonita e que posso tudo. Olho-me no espelho e não vejo defeito algum - a não ser a espinha que nasceu no meu nariz e que me motivou a escrever esse texto. Vejo meus olhos e minha boca mais indígena que negra e acho lindo; vejo meu largo nariz, meu cabelo encarapinhado (que insistem em intitular de “ruim”) e acho bárbaro. Não sei qual é a graça de ser igual a todo mundo, muito menos igual a todo mundo da mídia. Eu me vejo pouco nas bancas de jornal e só acho uma pena, porque lá no fundo, as bancas seriam boas distribuidoras de uma beleza não-efêmera (parafraseando a cantora Céu).

O dia que o Brasil estiver preparado para se olhar no espelho, serão outros 500, só não desejo que leve mais 500 anos.

3 comentários:

Anônimo disse...

"se vc soubesse o valor que preto tem, tomava banho de piche e virava preto tambem..." ....é isso aí minha linda. O que é nosso tá guardado, e faz 500 anos que tentamos tomar na base da porrada... Mas nao demora.

Marjorie Chaves disse...

Querida, me vi literalmente neste seu texto, com a ressalve de que, felizmente, nunca quis ser paquita! Ufa! Mas enfim, poderia lhe escrever infindas palavras sobre este tema, mas muito mais que tantas pessoas, vc sabe da minha posição e o quanto NÓS somos lindas com esta cor que a natureza nos deu, com esta força e este poder que nos confere nosso nome.

Beijos...

Marjorie Chaves disse...

OBS: não ligue para os erros grotescos, é a falta de tempo... [apesar do prazer de ler].

=]