sábado, 30 de junho de 2007

Do fundo do baú

Ainda embalada em minhas memórias, lembrei-me de algo muito curioso da minha infância: meu estilo musical cheirando à poeira.

Ouvi muito Xuxa, Chiquititas, Spice Girls sim, mas inexplicavelmente sempre amei os vinis e suas raridades. Hoje escutei “Lacinhos cor-de-rosa” e pude resgatar o começo desse romance com Longs Play.

Era Celly Campelo, uma capa azul com rosa, cheia de músicas juvenis do meio do século XX. Eu tinha seis anos e me deliciava cantando “Tomo um banho de Lua”. O mais estranho é que nunca ninguém escutou Celly perto de mim, logo não teria de onde herdar o gosto por aquelas baladinhas melosas.

O tempo passou e as preferências também: Jorge Ben Jor, Martinho da Vila, Alcione... Minha primeira música predileta da Beth Carvalho saiu de um LP. Elis, Chico, Enredos de Escolas de Samba, tudo o que fosse bom rodava minha vitrola e embalava meus sonhos de menina de 13, 15 anos.

Na atualidade, a tecnologia ajuda muito os amantes de raridades. Pelo Win Rar e blogs pela internet baixo álbuns do começo da década de 70, ou até mesmo mais antigos, artistas inimagináveis para a minha geração: Donga, Clementina de Jesus, Noel Rosa e Wilson Batista. Gente muito boa e muitas vezes esquecida.

Mas esquecidos mesmo andam os vinis, os tais bolachões, perdidos em caixas ou em armários. Poucos aparelhos possuem vitrola e impedem o prazer (imensurável) de escutar Jamelão in natura.

Sorte a minha de ter um aparelho e antigo da Gradiente. Posso cantar com mais fervor os clássicos sambas de Cartola.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Memórias

Hoje me chamaram de "tia". Eu tenho 20 anos e cara de 18, dizem certos garçons de butecos. Mas não gostei de ser chamada de "tia" por uma menina de 13 anos. Até esses dias eu era uma menina de 13 anos, que mal sabia do mundo e ainda flertava com as Barbies. Sempre adorei brincar de Barbie. Eu tinha sensação incrível, eu manipulava, fazia o que queria. As alegrias, tristezas, medos e desejos surgiam na dose que me agradava. Não era que nem a vida real, que não tinha controle e que me dava um certo receio.

Ontem, sentada no bar [para não perder o costume], falava abobrinhas, quando chegamos a certas lembranças da infância. Minha amiga cantou "Meu lanchinho" e quase fui às lágrimas. Lembrei de mim, sentada, com a lancheira aberta, com a toalhinha estirada e os biscoitos espalhados em cima dela. A garrafa de suco que sempre [repito sempre] entornava, e manchava de maracujá ou de uva a tal da toalhinha.

Eu de vez em quando ia ou voltava a pé da escola, na época do pré. Era pertinho de casa e eu ia brincando no caminho. Debaixo de um prédio na quadra do lado, tinha [ou melhor tem, pois ele resiste firme e forte] um hidrante. Pior, eu era apaixonada pelo hidrante. Não sei porquê, só sei que ele é vermelho e, na época, era quase do meu tamanho e falava comigo pelo visto. Criança tem cada criatividade que nos surpreende.

Lembro de pouquíssimas coisas da minha infância até meus seis anos, não sei se é trauma, se é escolha, ou o que é, mas sei que quase nada ficou. Uma piscina em forma de feijão, as freiras ensinando rezar o terço, as quadrilhas, ou minha mãe puxando meu cabelo e eu ficando com cara de japonesa no final do penteado. Restou pouco mas o suficiente para acreditar que foi uma boa infância.

Acho no fundo nem ligo de ser tia, a infância passou mesmo. Que venham as alegrias de um adulto... se é que existem....

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Noite Junina

Uma vez lhe disseram que os olhos são a candeia do corpo e, se eles são bons é porque o corpo tem luz.

Ela olhava firme nos olhos dele. Virou um hábito. Parecia que dessa forma via melhor as pessoas. Os olhos são a janela da alma, não é isso?

Ela via o reflexo do fogo; era o brilho vermelho da fogueira nos verdes cansados. Vermelho simboliza amor, mas não havia amor; havia fogo, e fogo pode ser paixão. E era. Uma antiga, dos tempos idos e esquecidos. Ela não sabia se gostava de retornar, não sabia se compensava, mas sempre voltava. Em busca de velhas novidades.

Era calor no meio do frio de junho. A noite mais fria, dizem os crentes. São João traz noites frias para que as pessoas busquem esquentar seus corações.

Ela rememorava todas as noites juninas anteriores, que foram frias, secas e solitárias. Ecoava no seu interior as tristezas e amargas lembranças. Quantas mentiras foram contadas, a fim de esquecer o passado? Quantas promessas foram quebradas por puro capricho do destino? Quantas palavras sem ritmo foram criadas atrás de uma justificativa?

Ela não buscava mais respostas vãs. O fogo haveria de queimá-las.

terça-feira, 26 de junho de 2007

HÁ MAR

Certa vez, contando certa lenda, um certo Deus berrou. Berrou tão forte que o vento estremeceu. Berrou falando “Eu te amo” e fez a brisa do mar...
No mar há amor, há cria, há vida. Há gente ávida pela vida.
Quando se muda para o cerrado o mar se vai, se esvai, se esvazia. Se não há mar, como amar? Se não há vida, como ser ávida por qualquer coisa? Qualquer coisa colorida....
No cerrado o homem é cercado de ilusões, de falsas promessas e de traições. Há tortuosas árvores e tortuosos caminhos. Há espinhos. Há saudade.

*Adeus Brasília?

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Indagações

Quatro jovens da alta classe média da Barra da Tijuca espancaram uma mulher no Rio de Janeiro. Olhos, braços e tronco roxos, e uma humilhação sem tamanho foi o que restou para a empregada doméstica que trabalha no mesmo bairro que os agressores.

Eles provavelmente estudaram a vida toda em colégios particulares e hoje freqüentam cursos caros em uma faculdade também paga. Disseram ser as melhores escolas, com a melhor educação. Ecoa no choro do pai da vítima: que educação?

Os garotos Zona Sul tentaram justificar o erro, pensaram que se tratava de uma prostituta. E daí? Prostituta merece apanhar como Judas no Sábado de Aleluia? Me indago pensando que tipo de gente o mundo está criando, aí penso mais e talvez não seja gente, e sim animais. O ser humano está se tornando mais arcaico a cada dia e chega ser um despautério tratá-los como animais – eles não seguem instintos, eles possuem uma irracionalidade surreal: aprendem o melhor, comem do melhor, se desenvolvem em meios propícios e saudáveis e destroem tudo, graças a uma inexplicável atração pela perversão.

A pior parte desse lamentável episódio é que nada vai ocorrer com eles. Uma gorda fiança e bons advogados manipuláveis resolverão tudo com contatos propícios que vão impedir o cárcere. A lição de moral? Estamos criando monstros, seres incapazes de respeitar o próximo. Talvez exista mais uma chance para salvar esse mundo mesquinha e esse país corrupto que vivemos. Lutar por justiça e praticar o bem não é utopia, é uma memória que esquecemos e que deve ser resgatada.

domingo, 24 de junho de 2007

O Mar

Olhava fixamente para o mar, não sei o que mais me encantava: sua grandeza ou sua capacidade de levar os males.

O mar também acabava levando sonhos; sonhos doces e imaculados que se desgastaram com o excesso de sonhar. Levou também ilusões – amargas como fel- que por muitas vezes se mimetizaram e acabaram se mesclando com tais sonhos. Ilusões que parecem sombras: sempre em algum lugar, ocultando algo.

A noite acabocanhara o Sol, deixando rastros de luminosidade com as pequeninas estrelas. Tão solitária e vazia. Só podia se escutar as ondas, levando o passado pesado de dor.

Timidamente a luz ressurgia mudando a maré e o fluxo de mudanças. Novas mutações haviam de surgir, jovens lagartas ainda se tornariam leves borboletas, fugindo de um mundo que as não pertencia.

Levantei-me, mas antes de ir embora contemplei um pouco mais o mar, respirei fundo e enxuguei as lágrimas e prometi não mais causar cheias naquela imensidão de água.

Março de 2006, após Terra Sonâmbula.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

O primeiro Carnaval no Rio [2006]

O primeiro Carnaval no Rio ninguém esquece, ainda mais quando se tem 19 anos.Eram seis amigos no total; seis mentes e corpos inquietos brasilienses, ansiosos por um Carnaval de verdade, sem chuva, Pacotão ou Baratona.

Ao chegar na Cidade Maravilhosa me comovi -quase chorei-, não chegava no Galeão,ia de ônibus como todo estudante quebrado, mas não deixava de cantar “Samba do Avião” de Tom Jobim: “Minha alma canta...”.O Rio pra mim sempre foi clichê, mas descobri com o tempo que também nos rendemos ao clichê; e lá estava eu boba e apaixonada pela cidade mais batida do meu país.

Tudo me encantava: ver o sambódramo, o trânsito, o caos, a malandragem, era tão maior e tão mais bonito... Amo Brasília, mas minha querida cidade moça, que nem 50 anos tinha, não possuía aquele frisson que a Cidade Maravilhosa possuía.

Quando se é apaixonado por Bossa, estar no Rio é mais mágico ainda. Cantava o dia todo: Tom, Vínícius, Baden, Nara, e me enlouquecia mais ainda imaginando suas histórias. Na época lia as memórias de Danuza Leão (irmã de Nara) e estar na frente do Copacabana Palace era viver por alguns instantes nos anos 50, 60 ou 70. Na verdade eis minha grande inspiração: a Bossa Nova.

Muita coisa mudou desde a Garota de Ipanema pra cá, mas outras continuavam as mesmas.
Rio era sinônimo de frenesi, mistura e desafios. Era paradoxal passear em tranqüilos blocos de família pelo Flamengo... sóbrios e relaxados e em outros tempos, ver jovens comprando drogas com facilidade no tranqüilo Leme. Talvez uma mesma juventude que se drogava em tempos passados.

As drogas variam, porém, o álcool e o cigarro eram companheiros velhos que insistiam em nunca desaparecer, vícios não se largam,se amenizam.

Assim aquela cidade ia se tornando tão mais louca, mas ainda tranqüila o suficiente para se perder vendo por do sol no Arpoador, na altura do Posto cinco. Infelizmente o tempo foi curto de mais para Ipanema e Leblon e o tão famoso (e clichê como não?) Posto 9 ficaram pra próxima.

Ao andar por Copa (já me sinto íntima) cantarolava “Ela é carioca”, me sentindo a própria.Não queria voltar pra casa; era tão bom passar uma semana nem problemas, obrigações ou qualquer outra coisa que me fizesse pensar muito.O máximo que me permitia era pensar qual bloco de rua iríamos aquele dia.

Todo Carnaval tem seu fim já diriam uns meninos barbudos que misturam Bossa com Rock -ou sei lá o que é aquilo-, e voltava pra Brasília triste por não continuar cantando “Dia de Luz, festa do Sol...” na praia do Botafogo, observando o bondinho que passa sem pressa, assim como a vida deve ser.

A tristeza consome ao chegar ao destino, uma chuva melancólica nos recepciona e me lembrava do astuto Sol que nos despediu do Rio, me lembrava dos blocos, das marchinhas, da gripe que peguei por cometer alguns excessos (talvez seja o ar condicionado também), me lembrava a simpatia de um povo que está sempre bronzeado de Sol. Chega de saudade, pois a Semana Santa se aproxima e se for possível, lá vamos nós engrossar o coro da música de Gil “E o Rio de Janeiro continua lindo...”

quinta-feira, 21 de junho de 2007

Quem sou eu?

Eu carrego a canalhice lusitana
Sou a utopia de um país
Sou pobre, sou preto, sou malandro, sou puta
Sou indigente, incapaz de se tornar gente
Sou o carnal, sou o carnaval, sou o samba, sou o choro
Sou o pronto de um povo

Quem sou eu?
Tenho dois sobrenomes: um é pobre, é de Deus
É o espelho do açoite, a fuga da senzala
O outro? O outro é do meu senhor, é um Sousa, é um Silva
É um qualquer, é a marca que carrego do cativeiro

Quem sou eu?
Sou a mulher, sou o homem
Sou quem luta pelo preto e pelo crespo
Sou quem grita pela libertação
Quem liberta meu povo é Zumbi
Quem liberta meu povo sou eu

Quem me liberta?

terça-feira, 19 de junho de 2007

Cacofonia doce

José: p.s: Sabia q vc tem uma pasta em meus favoritos?
Algumas pessoas incluem pessoas em pastas, eu inclui uma pasta para vc.

Eu: que doce o que tem nesa pasta?
haha ficou engraçado esse diálogo

segunda-feira, 18 de junho de 2007

res-des-construção

aborto
morto
posto

quem é o justo para dizer não?

suposto
frouxo
torto

que luta vai dizer sim?

tenso
silêncio
penso

o silêncio das inocentes se ecoa perdido procurando um fim.

domingo, 17 de junho de 2007

O tempo

O tempo é o grande mote do século XXI. Na verdade, a falta dele.

Reli Lavoura Arcaica de Raduan Nassar. Fantástico. Ler obrigada, sobre pressão nunca flui; no máximo, a pressão pessoal, motivada pelo desejo da leitura. A falta de tempo destruiu a obra do paulista, natural de Pindorama. Eu vi o filme. Bárbaro. Fui obrigada a reler – seria uma injustiça se não o fizesse.

Nassar focaliza sua obra na família, na idéia do clã e da união; da terra como a base de tudo. Não foco no foco, penso como o autor trabalha o tempo.

Eu me aflijo com a falta de tempo e me pergunto por que ele dura tanto, ou às vezes porque é curto demais. Raduan acredita que “o tempo sabe ser bom, o tempo é largo, o tempo é grande”. Talvez por isso nos perdemos: depositamos nossa fé nessa grandeza e o horizonte se torna remoto.

Não temos tempo para amar, para dar risadas ou para chorar: a máquina humana estagnou na espera do longo caminho do tempo.

Por vezes temo esperar demais e fazer de menos; deixar para amanhã o livro, o bar, a praia e tudo virar ontem.

É certo ou errado ter fé na espera? Acreditar que o depois vai dar certo? Nassar diz que “só a justa medida do tempo dá a justa medida das coisas”. Falta o tempo ser justo.

sábado, 16 de junho de 2007

Paixões de 09.maio.07

Quarta, dia 09 foi um dia de paixões: a paixão dos católicos apostólicos romanos com a chegada do Papa Bento XVI - o mosteiro de São Bento em São Paulo, no centro, nunca foi tão comentado; e a paixão dos fanáticos por futebol, mais especificamente dos rubros-negros cariocas: Flamengo versus Deportivo do Uruguai (nota de quem faz espanhol há um semestre e acha que fala horrores: V tem som de B). O Mengão deveria fazer quatro gols e o time uruguaio nenhum para a permanência na Libertadores. Não foi bem assim.

Eu via católicos fervorosos e hipnotizados gritando "Bento, Bento!" rimando com os torcedores no Maracanã "Mengo! Mengo!". Via pessoas esmagando outras, tudo por um só motivo, um só sem explicação racional. No Maraca, lia-se em certas placas: "Eu amo o Papa", e na terra da garoa os devotos vestidos com o manto rubro-negro, rezavam o Pai-Nosso.

Não entendo, do fundo do meu coração, o porquê de tanta devoção - de ambos os lados. Mas essa bossa que é coisa nossa, coisa de tupiniquim é o que nos move, é o que nos faz ser o que somos e o que nos mantêm: a fé.

O Flamengo só balançou a rede do adversário duas vezes, não adiantou. O Papa Bento XVI disse que era contra o aborto, mobilizou. Os dois casos, geraram tristeza e decepção coletiva em algumas facções.

Agora penso com os meus botões: saio do eixo Rio-São Paulo e chego à Brasília, cidade-ilha, excluída e exclusora, quarentona, caretona rock'n'roll. Quais são as paixões dos residentes dessa utopia? E suas satisfações? A vitória de 1 x 0 do Brasiliense (que é de Taguatinga) sobre o Ipatinga?

Faltam prazeres nessa cidade fria.

sexta-feira, 15 de junho de 2007

07.maio.07

Eu quero escrever. Qualquer coisa. Quando o amor murchou a fonte secou. Nessa manhã de segunda - melancólica segunda - ouço papos de Flaubert, Pessoa, Vinícius...Recitaram Drummond. Aí eu senti falta dos meus poemas. Me lembrei como essas manhãs me inspiravam. Travei de uns tempos pra cá.

Tanta gente homenageia Januária na janela e eu só queria homenagiar o amor. De João, de José, de Jorge. Dos meus sonhos e presentes.Ou passados. Gente que passou e marcou. Gente imaginária que habita meu futuro sonhador.

Houve um tempo que eu amei mais do que pude. Gravei na pele a paixão louca da casa dos dez. Eu mudei de dígito e me forcei a mudar de ares. Eu precisava mudar, largar aquele vício para o meu bem.

Meu bem. Tive uma paixão chamada meu bem. Tive um chuchu, tive um chiquito. Tive tantas coisas... Resolvi guardar cada um como doce lembrança. E só.
Lembrar...Caso eu resgate cada coisa boa de cada um faria um lindo recital de desejo e medo. Caso contasse as tragédias, A Poética se faria perfeita, em todos os sentidos.

Semiótica. O estudo dos signos, linguagens, e assim vai. Qual é o significado de todas as minhas palavras? Para qualquer um, nula. Assim como a Semiótica para o leigo. Mas para mim, é muito. É parte do meu eu se revelando em mais uma manhã pós-domingo, que esqueci de comprar o jornal, que eu curti a preguiça da ressaca.

Eu resolvi escrever para marcar, sem ser na pele, mas no papel, a vontade por novas paixões, amores ou devaneios. Seja quem for, como for. Só para sentir a vida, pulsar, aqui dentro.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Brasília, um RIO de saudade

Esses dias ouvi uns escritos lindos de Vinícius para Antônio Maria - aquele que era jornalista, casado com a Danuza Leão sabe? O amigo do poetinha tinha morrido e ele contava as novidades do Rio. Aí lembrei de você, claro pelo Rio e não pelo incidente. Pensei em você longe, olhando o mar e eu aqui com saudades suas olhando para cada pôr-do-sol, imaginando como seria se você estivesse aqui.

Domingo, passeava pelo Eixão, aquela avenida larga que cruza as asas de Niemayer, quando vi todas aquelas árvores secas, retorcidas, parecendo lembrar os caminhos tortuosos da vida. Perdida no meio da grama cortada rente tinha um ipê roxo, tentando, talvez (quem sabe?), representar a sabedoria, ou mesmo só pra lembrar como o cerrado pode surpreender a gente.

A semana passou arrastada sem você. É a mesma rotina de acordar cedo, ver jornal, esperar dar a hora de ir embora e enfrentar aquele engarrafamento. As luzes da cidade sincronizadas, junto com os caóticos faróis dos carros. É tanto carro, meu bem, aquela cidade provinciana não existe mais, a não ser quando se trata dos bares. Ahhh,os velhos bares, continuam velhos e clichês: as sextas todos bebem Antrática até o dinheiro acabar, quando começam as cruéis rodadas de Brahmas e cachaças até o boteco fechar.

Algumas coisas mudam, outras não. O céu rosa com cor azul ainda é o mesmo; as madrugadas geladas de junho também, mas Brasília sem você é mais seca que o habitual.

terça-feira, 12 de junho de 2007

O que não tem remédio remediado está

A vida é tão breve que nunca percebemos sua presença, só sua ausência.

Minha mãe costumava comprar os remédios sempre na farmácia perto de casa, que era barata e valia muito a pena comprar as coisas lá. Eu me lembro da última vez que tínhamos ido: eu no carro esperando a mãe, cujo cartão de crédito insistia em pifar. O João, o atendente era muito bacana e sempre perguntava se ela queria o remédio para a lente de contato. Como o tal do remédio andava meio caro, minha mãe ficou um tempo sem comprar.

Isso tudo tem um mês. Ontem minha mãe resolveu comprar o tal do remédio e foi até a farmácia. João não estava. João tinha morrido. Pensei "Como morrido?". Eu nos meus 20 anos não creio que a minha vida seja breve - ela deve ser suficientemente longa para algumas histórias a mais, alguns amores e alguns porres homéricos.

Uma moto e um caminhão. Uma colisão tirou a vida de João. Isso tem mais ou menos um mês. Pela obviedade simples, deve ter sido logo após a última compra na farmácia. Ainda me lembro da pele clara, do jeito manso de falar, posso lembrar-me de muita coisa; e não posso acreditar que nunca mais irei vê-lo.

João, o cara da farmácia deve ser mais uma estatística de trânsito agora. A vida é breve e para tudo tem remédio menos para morte. A morte chega e nem avisa. Se avisasse ninguém a receberia. Como diria o ditado: o que não tem remédio, remediado está.

O Anjo

Era uma mulher com o predestinado nome de "Graça". Branca, de baixa estatura, com cachos na cabeça e de serenos olhos azuis. Como um anjo ela surgiu em meio uma tempestade de tristezas. Ela disse: "As lembranças ruins irão embora". Então foi aí que caí em prantos e pensei que, talvez, a fé pode mesmo remover montanhas.

domingo, 10 de junho de 2007

Os mandamentos da louça

Lavar louça é uma arte que requer técnicas e leis.

1) Música. Todo hábito de lavar louça deve ter música. Pode ser um bom samba para animar ou Chico Buarque para criar lágrimas. Preferência por vinis.

2) Juntar pratos e copos pela casa. Péssimo achar um copo sujo no quarto depois da louça lavada.

3) Começar pelos copos e talheres. Panelas por último.

4) Sempre evitar as vasilhas de plástico. Podem ficar até mesmo depois das panelas. Essas vasilhas são imãs de gorduras eternas....

5) Nunca trazer mais louça quando a pessoa já está acabando de lavar. Nada pior que isso.

Boa ter-a-pia!

sábado, 9 de junho de 2007

Dores de Amores

Caso um: Maria dança alegremente e quando pára o samba pede bis. O cantor ensaia "quero morrer numa batucada de bamba, na cadência bonita do samba".Ela se incomoda, se lembra de João, doce malandro que causou um estrago no seu coração. Não pode parar. Samba até o dia clariar.

Caso dois: Os belos olhos azuis de Tereza perderam a cor com a chegada de Jorge. Jorge trouxe a tira colo seu novo amor. Ela até fez promessa pra Oxumaré de subir a pé o Redentor. Ela jurava viver o grande amor. Os amores são eternos, o que muda é a pessoa. O samba de Tereza se tornou triste e melancólico. Se tornou uma recordação.

Caso três: Amélia era mulher de verdade. Amélia rodava na pista com ar de encantada. José olhava desolado. O malandro havia voltado, porém não compreendeu que não se pisa, nem com as pontas dos pés, num coração. Do outro lado do salão mais um suspiro de saudade.

Caso quatro: A Rosa arrasou com seu projeto de vida. De querida virou vadia. Joaquim balia tranquilamente com sua esposa quando longos fios pretos de cabelos vão ao seu encontro. Um cheiro meio doce-amargo de carvalho o faz lembrar daquela menina, que fora sua amante e fugiu. Ela jurou voltar.

sexta-feira, 8 de junho de 2007

O racismo e a hipocrisia

O caso dos gêmeos idênticos foi resolvido: os dois concorrem pelas cotas na UnB. Várias coisas me chamaram atenção nesse fato. Antes deles e antes de escrever esse texto, pensei: "Lá vou eu escrever pra variar sobre cotas", pois é, mas se não for eu vai ser quem? Eu, como estudante negra, mais do que devo me pronunciar sobre o assunto. Convido todos a uma reflexão.

Bem, os irmãos são agora cotistas. Um deles, na televisão, afirmou que era contrário as cotas, porque era uma forma de racismo e só entrou no sistema porque era mais fácil de passar. Fiquei indignada com a declaração, mas depois percebi que ao menos ele não mentiu.

Na minha época de Ensino Médio e cotas recém-lançadas era um bafáfá esse assunto. Tendo estudado em uma escola particular pop da cidade ouvi e vi as maiores asneiras que poderiam ser proclamadas pelos ignorantes adolescentes que sempre acham saber tudo.

Certa vez ocorreu um movimento em apoio ao novo sistema e eu estava com um adeviso "eu sou a favor das cotas". Uma menina da minha sala chega e me indaga: "Você é racista? Como pode aceitar as cotas? Isso é racismo também!". Aí tive que explicar que não era racismo, era uma reparação mais que justa, que é emergencial e que no futuro talvez (assim espero) não sejam necessárias. As cotas são uma chance a mais para o povo preto encher as universidades, majoritariamente brancas.

Não satisfeitos, outro estudante me questiona se é justo que eu, estudante eterna de colégios particulares, concorra pelas cotas. Mais uma vez tive que explicar o óbvio, que muitos dessa elite não enxergam: as cotas são para cor, não para classe. Eu sou negra de qualquer jeito, sofro preconceito onde estiver e não só posso como devo usufruir de todos os direitos que me cabem. Mas confesso que uma certa dúvida me abateu. Seria eu hipócrita?

Na época das fotos para o julgamento da comissão responsável por dizer quem é negro e quem não é, vi o colégio cheio de gente queimada de sol, meninas que usualmente usavam chapinha com seus cachos à mostra, e algumas mais caras-de-pau com tranças. Gente que não se considera negra criando qualquer característica afro-descedente. Foi então que eu percebi quem era hipócrita nessa história.

terça-feira, 5 de junho de 2007

A crônica das saudades e das lembranças

Engraçado como às vezes as lembranças insistem em permanecer.
Esses dias ela lembrava dele de um jeito tão triste, tão melancólico, tão saudoso... Saudades do que ela não viveu.
É estranho acreditar nisso, mas ela tinha um dom raro: o sentir antes de viver - chorar de ausência sem ter tido a presença.

Ela sentia falta das conversas com ele na cama, depois do amor; falavam de abrobrinhas, de diferenças astrológicas e de como roubar um banco. "Nunca menos que 10 mil", ele dizia. Ela se perguntava da onde ele teria tirado aquele conselho. Mas só. Nunca falaram dos seus sonhos, desejos ou medos; no máximo elogios doces dele e alguma sacanagem pra esquentar a situação. Ela imaginava o dia que falariam do seu cotidiano, da vida mais abissal de cada um.

Ela sentia o sorriso dele, a risada,o sono e o cansaço. Ela nunca compartilhou seu sono com ele. Talvez por aprender que existe diferença entre amar, fazer amor e dormir com uma mulher. O sono dele já pertencia a outra, e o dela vagava em busca de repouso.

Ela sentia o telefone tocar e emitir a voz dele, ou os braços largos pelo seu corpo, confortado de qualquer mal que pudessa aflingí-la.

Em determinado momento ela parou de sentir, ou melhor, sentia um peso leve, um frio aquecido, uma dúvida certeira. Ela sentia a morte. Mas não a morte, a sra.morte, e sim a do baralho da cigana que anuncia a metamorfose. As lembranças dela mudaram de lugar.

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Casamento

Esses dias falava sobre casamento. Existe uma teoria que os casamentos dos envangélicos são melhores do que os dos católicos; os primeiros seriam mais ricos, logo, mais comes e bebes à disposição de seus convidados. Concordo em parte, porque para toda regra existe uma exceção.

Eu não sei porquê as pessoas se casam, se pela lógica vão se separar logo depois. Não se fazem mais casórios como antigamente...em que a mulher agüentava ser corna e o marido um babaca para sempre. Hoje eles se divorciam.

Mas tanto faz quem casa ou não. Jornalistas da religião que forem, também fazem boas festas de casamento:

João diz: Já fui nuns de evangélicos, foram de primeira mesmo...O da irmã do Joaquim também foi memorável.

Maria diz: A irmã do Joaquim ela casou? Que babado...Mas ela não é evangélica. É?

João diz: Não, ela é jornalista mesmo...



Risíveis Amores

Eu acabei de ler o livro do Milan Kundera. Retiro minhas críticas em parte sobre ele... Risíveis Amores é bom sim. O autor ainda trabalha a idéia do peso, da leveza, da compaixão, o problema é que os textos são pedantes, cansativos. Se arrastam e nos arrastam junto. Mas ainda criam aquelas catarses gostosas da boa literatura.

Os amores são risíveis para não se entitularem trágicos, essa é a jogada de Kundera. Ele fala da falta de comunicação entre os que se amam e o caos gerado nessa ausência.

A falta de diálogo mata os relacionamentos; mas aí me pergunto se tudo realmente deve ser dito, ou se certas coisas devem permanecer nas profundezas do abismo da confusão.

O amor seria mais cômico ou mais trágico? O que é o amor? Porque o amor motiva tantas histórias, tantas inspirações, etc? Acho que é porque o amor é incógnita.

domingo, 3 de junho de 2007

Sétima arte no sétimo dia da semana

Hoje é domingo, pé de cachimbo.

Meu sábado rendeu mais (ou não) do que eu esperava. Não me sucumbi ao Caldeirão do Huck e nem a nenhum programa televisivo, ao invés disso, fui ao cinema, ao esquecido Cine Brasília.

Antes de contar sobre o filme que eu vi, eu fiquei pensando: "fazer um blog é uma coisa muito carente, muito 'me leiam, preciso de atenção' ", tá aí, nem sempre. Por pensar isso, resisti bravamente, durante esses sete anos que possuo internet. Mas agora cá estou, por uma necessidade diferente. Jornalistas devem ser lidos, e eu como aspirante, devo escrever para qualquer um ler. Ao longo dos meses os textos devem ir se modificando (evoluindo, tomara!), se tornando menos biográficos, mais crônicas do alheio.

Tá, o filme: "Cafundó", dirigido por Paulo Betti e estrelado por Lázaro Ramos, conta a história de João de Camargo, um homem que fundiu o catolicismo com o candomblé e mostrou que a cura vem da fé. Além de uma fotografia marcante e quatro kikitos do festival de Gramado, mostra nossos melhores atores negros conhecidos e desconhecidos. Vale a pena, de verdade.

Já que estamos aqui falando de sétima arte, indico também "Princesas", escrita e dirigida por Fernando Léon, aborda o mundo da prostituição e os sonhos e aspirações dessas meninas mulheres de "difícil vida fácil". Uma espanhola, Caye (Candela Peña); outra da República Dominicana, Zulema (Micaela Nevárez). Mesmo idioma, mesma profissão, mesma vontade de mudar.

Bem, por enquanto é isso. Quero ir hoje no Cine Brasília de novo, ver o último dia da Mostra Internacional de Cinema "A vida é mais forte que a AIDS" ...Parece bacana.

sábado, 2 de junho de 2007

Inauguração

Faço jornalismo e me disseram para escrever todo dia; penso em dia sim, dia não. Meus amigos de curso fazem blogs agora também. Aí aquele texto que ia ficar guardado no meu caderninho em espiral de 96 folhas vai ficar na internet. No mundo global, aos olhos de todos, à crítica de todos. Claro que, sinceridade, o meu melhor não estará aqui. Estará no meu caderninho, mas aí quem sabe, um dia, alguém terá o prazer de ver o meu melhor? O melhor está no detalhe.

Hoje é sábado, acordei cedo, fiz exame de sangue, caminhei, vi gente de todos os tipos, fiquei suada...O Sol estava lindo...

Nada de interessante para hoje, no máximo, um livro, uns textos e umas reflexões sobre a literatura best-seller em torno do Afeganistão. Além disso aquele livro do Kundera, Risíveis Amores. Posso falar? Tô achando chato à beça, mas também, fui seca, esperando ser algo como A insustentável leveza do Ser. Em falar nisso, qualquer hora escrevo sobre esse livro. É o meu predileto.

No meu textinho original, aquele do caderninho, eu falava de amor, mas não vou falar por enquanto não. Amor é a força motriz de mim, logo desse blog também.

Qualquer coisa eu volto. Qualquer coisa eu modifico.

Bem-vindos!