quinta-feira, 18 de outubro de 2007

A carne mais barata do mercado é a MINHA carne negra

Ontem, minha querida cantora Elza Soares se apresentou aqui em Brasília, no Teatro Nacional. De graça, com os devidos atrasos e com clássicos como "Se acaso você chegasse". Mas em algum momento a casa caiu, o show que estava jóia - e me pareceu tão curtinho - ficou com um certo clima de tensão.

Elza, no seu direito de cidadã, ao cantar a música A carne, de Seu Jorge, Marcelo Yuca e Ulisses Cappelletti, disse que era contra as cotas, que queria era igualdade e educação. Alguns aplaudiram, outros não [eu não aplaudi]. Logo em seguida ela cantou o Rap da Felicidade e o público cantou junto, animado.

Critiquei forte na hora e me chamaram de "politicamente correta demais"; outro disse que eu "levo tudo a sério", mas acho que não entenderam a minha crítica.

A cantora pode falar o que quiser, cantar o que quiser, mas será que não soa hipócrita um público classe média, média alta, cantar no teatro [NACIONAL!] : "eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente na favela onde eu nasci"? Hipócrita porque alguns deles vão chegar em casa e recriminar o funk, e dizer que é coisa de preto e favelado e achar um absurdo alguém escutar e ser capaz de se entreter.

A atitude de Elza é válida no sentido de trazer o morro para qualquer lugar que não seja o morro. Mas bem...vamos entrar no outro tópico do bate-boca:

As palmas brancas contra as cotas. Novamente digo que a cantora pode achar o que quiser, mas a mídia, esse quarto poder que bota pra fu*, não tá nem aí, pode muito bem usar as palavras dela [Elza] para continuar a campanha "cotas-não". Os meios de comunicação são tão cruéis... Pois, são eles que trazem o dado que somente 6% da população é negra e são eles que se esquecem de falar sobre o problema da auto-afirmação brasileira.

Espero que a Elza continue cantando "A carne mais barata do mercado é a minha carne negra", e que os brancos, negros, na favela ou no blablá Hall, se sensibilizem, reconheçam seu racismo e a partir daí coloquem em prática a igualdade - o racismo só pode ser combatido se assumido.

"A carne mais barata do mercado é a carne negra
Que vai de graça pro presídio
E para debaixo de plástico
Que vai de graça pro subemprego
E pros hospitais psiquiátricos"

11 comentários:

Anônimo disse...

Eu também não aplaudiria.

:)

mais uma vez, maíra: muito bom!

Anônimo disse...

tu esparra demais guria....

Daniel Mello disse...

Bom, acho que para que o sistema de cotas que realmente funcione seria necessário também um critério econômico.
O sistema de cotas visa a Inclusão. E não adianta falar de inclusão se os que passarem pelo sistema forem negros que já tem acesso a boas escolas e bens culturais.
Claro que todos os negros sofrem com o racismo. Mas existem aqueles que podem muito bem competir em condições de igualdade com os brancos sem precisarem de cotas.
Acho estranho esse ponto da questão de classe social não estar mais presente nessa discussão.

Mah disse...

1º adianta sim um negro de classe mais abastada entrar pelas cotas. é dificil de entender, mas a questão das cotas é racial e não social. o que queremos é negros na universidade, independentemente da sua classe social. a classe social é muito importante sim, claro, mas a discussão é cor da pele.

2º não estamos falando se existem negros ou não com condições de igualdade. é preto? pronto! cotas!

3º a aceitação das cotas fica muito complicada por pensamentos como esse."ah a questão social". os brancos que criticam as cotas usam esse argumento e acabam desvirtuando a proposta incial.

Anônimo disse...

A proposta de cotas aqui não é simplesmente inclusão étnica, é social mesmo. E por isso partiu-se do pressuposto que preto = pobre. Acho isso um tanto preconceituoso. Vc não?
Todo mundo sabe que o Brasil é um paisinho hipócrita. O racismo some assim que o negro pode pagar pra que esfreguem o chão que ele pisa.

Daniel Mello disse...

1º O que eu disse é que um negro abastado tem condições de entrar na Universidade sem cotas. Se vcoê deixa a cota para um de classe mais baixa temos a chance de dois negros com curso superior.
2º O modelo de racismo brasileiro não é o do Apartheid, divisão de cada um prum lado. Ele se baseia no mito da misceginação o que torna o problema profundamente social sim. O racismo se apresenta com mais força e crueldade de maneira estrutural, os negros não conseguem bons empregos e bons salários. Não estou negando a discriminação. mas acho que um nego discriminado que come é melhor que um que não come. Fora que a partir do momento que ele consegue ascensão social, o discriminado passa a ter mais poder de influência na sociedade.
3º Aspectos de discriminção não se resolvem por cotas. Só se resolve trabalhando a cultura, educação e o imaginário social. Se o racismo não some quando um negro pode pagar para esfregaram o chão que ele pisa porque incluí-los na universidade? Polarizar a discussão só atrapalha e fortalece argumentos racistas. A questão racial está ligada a social, e as duas precisam ser trabalhadas em conjunto.
4° A maioria dos pobres são pretos. Preconceituoso? Foi isso que eu vi pelas periferias em que passei.

Mah disse...

Tô doida pra saber quem é esse Azevedo.


Bem, que a pobre= preto é quase intríseco. A maioria dos pobres são negros. A maioria dos negros são pobres. A palavra é preconceito, mas no sentido do outro lado. É o preconceito que torna essa dulpa real. Mas não é preconceito dizer que isso é verdade.

Bem, Daniel, entendo seu ponto de vista. Mas sinceridade? Acho utópico demais. Acreditar num Brasil com uma cultura, educação e etc diferente é acreditar demais. Acredito nas cotas como solução mais real e concreta para o caos atual.

Fico feliz com a discussão!

Alan Valentim disse...

Francamente não tenho uma opinião formada sobre a questão das cotas. Não sou contra e também não sou a favor. É sabido que a cota pela cota nada resolve. É como trocar e por uma roupa limpa num problema cada vez mais sujo. E outra coisa, sou negro e as vezestenho a sensação de que os "brancos tem que se desculpar por serem "brancos"? Perdão mas sou contra ao "pretocentrismo", que também não ajudaria muito. Nesse sentido apoio sim Elza Soares. Concordo com ela!

Anônimo disse...

O último comentário é de alguém que conheço dos tempos graduação na PUC-Rio. O termo pretocentrismo foi cunhado por mim ao me referir a uma certa "legislação" sobre o modo de ser negro (a estética é um mundo cheio de armadilhas). As diferenças devem ser respeitadas. Na verdade, tanto a Elza Soares quanto o Alan são pessoas como nós, que em alguma dimensão da vida demonstramos algum grau de alienação. Ninguém tem conscência política a respeito de tudo. Ninguém é "tudólogo". Concordo com autora do Blog, que aliás é muito bonita. Não acho nada legal as mulheres negras sendo apresentadas como escravas sexuais no clipes de Hip Hop americanos. Mas isso é assunto para o blog que estarei lançando em breve. Abs!

lukinos disse...

O último comentário é de alguém que conheço dos tempos graduação na PUC-Rio. O termo pretocentrismo foi cunhado por mim ao me referir a uma certa "legislação" sobre o modo de ser negro (a estética é um mundo cheio de armadilhas). As diferenças devem ser respeitadas. Na verdade, tanto a Elza Soares quanto o Alan são pessoas como nós, que em alguma dimensão da vida demonstramos algum grau de alienação. Ninguém tem conscência política a respeito de tudo. Ninguém é "tudólogo". Concordo com autora do Blog, que aliás é muito bonita. Não acho nada legal as mulheres negras sendo apresentadas como escravas sexuais no clipes de Hip Hop americanos. Mas isso é assunto para o blog que estarei lançando em breve. Abs!

Mah disse...

acho bacana esse post, mesmo depois de tanto tempo, render papos acalorados!