Essa semana assisti Ensaio Sobre a Cegueira. O melhor filme dos últimos tempos, mesmo com críticas estapafúrdias, como a de um crítico britânico que chamou a obra de Meireles de “deprimente”. Saca nada esse cara.
Fernando Meireles se superou. Para quem não sabe, ele é o mesmo diretor de Cidade de Deus - pra mim, melhor filme da retomada cinematográfica brasileira.
Ensaio Sobre a Cegueira é baseado no livro homônimo de José Saramago (jornalista e poeta português, vencedor do Prêmio Nobel), que conta a história de uma cidade que é tomada por uma cegueira branca e os “contaminados” são deixados em um lugar à parte, jogados à própria sorte.
A partir daí os instintos humanos se sobressaem. O melhor e o pior. Solidariedade e crueldade. Respeito e violação. Para quem não viu corra ao cinema mais próximo. A única certeza é a inquietação após a película.
E Brasília também está sendo tomada por uma cegueira, só que cor-de-rosa. Nessa semana, o jornal Correio Braziliense escancarou o que a gente tá cansado de ver pelas madrugadas, por ali, nas redondezas do Hotel Nacional.
Meninas fazem sexo oral por R$ 3 e meninos são espancados, além de violados sexualmente. Todo mundo sabe que isso existe, mas parece que ler os detalhes dói mais. Ouvir deve ser pior ainda.
Mas essa cegueira não é exclusiva da capital federal. É uma epidemia espalhada pelo país todo.
Quando eu tinha uns 13, 14 anos, estava em alguma praia do nordeste. Conheci uma menina que devia ter a minha idade e conversamos bastante entre uma onda e outra. Ela era de lá e visualmente dava pra perceber que suas condições financeiras não eram das melhores.
Passado um tempo um homem branco, feio e barrigudo se aproximou. Com uma cara maliciosa ele começou a conversar com a menina que dava trela pro papo furado dele. Ela sumiu em questões de minutos. Ele também.
Depois das matérias do Correio um monte de político disse que vai fazer isso, o governo aquilo, mas eu quero só ver até quando vão durar essas mudanças. Já já a cegueira cor-de-rosa volta e tudo fica por isso mesmo.
E quando ela voltar o que faremos? Assim como no filme precisamos de alguém que nos guie. E sem dúvida, os únicos imunes a cegueira serão esses meninos e meninas que sofrem na pele a dor do descaso.
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5 comentários:
Revisão: Ataide
Na verdade os institos humanos não afloram com a cegueira. A cegueira é uma metáfora da visão de mundo das nossas sociedades.
Quando as mulheres trocam favores sexuais por comida, a situação dos cegos do primeiro pavilhão é análoga a dessas meninas da rodoviária.
Os poderosos vetam o acesso dos mais fracos ao básico e por isso fazem deles o que querem.
Mas durante o filme, enquanto os fracos são oprimidos e humilhados, só um pensamento passava na minha cabeça: Quando que eles terão coragem para se rebelar? Acho que a passividade do fraco é o alimento da iniquidade do forte.
Ensaio sobre a cegueira
Que não é a primeira
Nem a derradeira
Muito menos passageira
Na verdade mais verdadeira
È tão regular quanto fazer feira
Para alguns mais uma besteira
Para outros a beira
Do precipício...
muito bem dito, estou lendo em diversos lugares o mesmo tema e a visão cor-de-rosa foi uma das melhores.
de arrepiar o descaso solto ao não encarar como crianças os abandonados.
bom mesmo!
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