domingo, 23 de agosto de 2009

O mundo em livros

Uma das melhores coisas que adquiri no curso de jornalismo foi o gosto por literatura do mundo. A brasileira é fantástica, rica e diversificada como qualquer outra expressão cultural nossa, mas há certas coisas que só o outro lado pode contar. Sem vícios, hábitos e bossas, bem coisas nossas.

Começo por Xinran, autora de Enterro celestial e As boas mulheres da China. Neste último, a jornalista chinesa dribla a dor em ser mulher em um país marcado pelo silêncio com situações inusitadas, como pintar somente uma unha de vermelho ou borrar o batom de propósito. Dessa maneira, ela chamava a atenção e as pessoas puxavam assunto com ela. Ao longo das conversas, ela trazia à tona tradições cruéis, discriminação e dor que muitas mulheres sofriam e que ainda sofrem.

Ao ler as perturbações físicas e psicológicas que aquelas mulheres passavam o coração dói.

Xinran veio ao Brasil neste ano para participar da Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) e deixou com mais vontade de conhecê-la. Merece ser lida e ouvida.

Milan Kundera é uma das melhores heranças literárias que o leste europeu nos deixou. Milan continua vivo, mas a inspiração de algumas de suas obras já passou. O tempo de uma Europa divida já passou. Apesar de alguns preconceitos ainda serem latentes, a comunidade europeia (em outros aspectos) está mais avançada do que o Mercosul e o próprio Brasil.

O autor tcheco escreveu belas obras como Risíveis amores (1969), O livro do riso e do esquecimento (1978) e Os testamentos traídos (1993), mas, definitivamente, A insustentável leveza do ser (1983) é o seu melhor livro.

A leveza e o peso, o amor e a compaixão e outros pólos nem tão opostos assim são a força motriz do enredo. Os encontros e desencontros de Tomas, Tereza, Sabine e Franz me fizeram pensar muito sobre os relacionamentos que tive. Esse papo pode soar como auto-ajuda, mas saiba, não é não. Com cenário histórico (a Primavera de Praga), Kundera traz ficção, romance e filosofia de uma vez só. Vale a pena ler. (Ver já não me responsabilizo. Há um filme com o mesmo nome do livro. Nunca vi, mas para quem ficou interessado, a direção é de Philip Kaufman).

De uns 5 anos para cá, apareceu a moda do oriente médio. O livreiro de Cabul, Eu sou o livreiro de Cabul (a contestação do primeiro), O caçador de pipas e uma lista interminável. Talvez a fórmula tenha se esvaziado ou o mote (ações do governo Bush) tenha acabado. Mas uma coisa inegável é que a abertura das cortinas serviu para abrir os olhos. Uma outra cultura totalmente diferente da ocidental existe e deve ser respeitada. Não há certo, nem errado, só o diferente.

Agora literatura africana. Ainda muito em moda também com uma série de título que falam principalmente sobre guerra. Mas há um autor que soube falar sobre esse tema sem soar clichê ou inconveniente.

Mia Couto é um biólogo apaixonado pelas palavras. O autor de Vozes anoitecidas, O fio das missangas e O outro pé da sereia se superou em Terra sonâmbula, meu livro predileto dele.

Não me canso de ler a história do miúdo Muidinga e do velho Tuahir. A fuga da guerra por meio dos misteriosos cadernos de Kindzu traz a história e a cultura do Moçambique. E são por esses escritos de Mia que eu descobri um continente lindo, cheio de cor e vida, longe dos clichês bélicos.

Mia Couto me apresentou com um novo olhar coisas que existem há tempos. Convido todos para a mesma viagem.

2 comentários:

Salve Jorge disse...

Livros e teu negrito
Ainda mais belo de ser dito
E lido
Transcendendo as fronteiras do vivido
Alargando o que poderia ter sido
Deixa tudo mais bonito...

Andréa Macedo disse...

A insustentável leveza do ser... Esse me marcou...